Desta vez escrevo uma resenha um pouco diferente das que eu venho postando até aqui. Vou falar sobre duas obras: Aventuras de Alice no País das Maravilhas e Através do Espelho e o que Alice Encontrou por Lá, ambas de Lewis Carroll.
Aventuras de Alice no País das Maravilhas
Naquela ribanceira, já podíamos ver que Alice estava um pouco inquieta, sem entender como sua irmã podia gostar de ler um livro sem figuras ou diálogos. Afinal, de que serve um livro sem figuras nem diálogos? De repente, Alice vê um Coelho Branco passar correndo. Inicialmente, ela não deu importância a isso. Mas, quando ele tirou um relógio do bolso do colete e começou a reclamar “Ai,ai! Ai,ai! Vou chegar atrasado demais!” a garotinha percebeu que havia algo estranho naquilo e então resolveu seguir o bichinho. Mas foi quando Alice, tentando acompanhá-lo, caiu dentro da toca do coelho é que realmente chegamos ao País das Maravilhas.
Alice caiu e caiu numa queda ‘interminável’. Quando finalmente terminou de cair, veja bem, a menina se viu num dilema. Estava num lugar estranho, onde havia uma pequena portinha que dava para um jardim encantador. Entretanto, Alice era muito grande para passar pela portinha, e devia descobrir como fazer isto. Entre uma garrafa com um aviso que dizia “beba-me” e um pequeno bolo que dizia “coma-me”, a garotinha se viu num cresce-diminui sem fim. Sem saber como fazer para chegar ao tamanho ideal, Alice se pôs a chorar. Sem perceber, seu choro formou um rio que levou ela e outros animaizinhos a um outro lugar (?). Já nesse outro lugar, que seria a beira do rio de lágrimas de Alice, ela conhece muitos outros bichinhos falantes e esquisitos.
A partir daí, Alice sai em busca de várias coisas, ora procurando uma maneira de chegar ao seu tamanho normal, ora querendo voltar para casa, e enquanto faz isso, acaba vivendo aventuras estranhas e conhecendo criaturas mais estranhas ainda, como o Chapeleiro, a Lebre de Março, o Gato de Cheshire e a Rainha de Copas.
Não conseguiu entender direito sobre o que o livro trata? Bem-vindo às Aventuras de Alice no País das Maravilhas.
Através do Espelho e o que Alice Encontrou por Lá
Alice estava brincando com suas gatinhas enquanto conversava consigo mesma. Foi quando a menina teve a ideia de atravessar um espelho da sua casa, fazendo de conta que ele a levaria à Casa do Espelho. Inesperadamente, isso realmente acontece, e Alice se vê nesta Casa. Lá, os objetos e seres vivos são o contrário do que ‘deveriam’ ser.
Quando sai para o lado de fora da Casa, a menina recebe a notícia de que poderia participar, ou melhor, fazer parte de um jogo de xadrez como uma das peças. Se vencesse o jogo chegando à oitava casa, Alice se tornaria rainha.
E assim corre a história: enquanto Alice tenta chegar à última casa para se tornar rainha, vai conhecendo muitas criaturas diferentes e enfrentando experiências estranhas pelo caminho.
Lewis Carroll com Alice Liddell, a garotinha que inspirou as Aventuras de Alice no País das Maravilhas e Através do Espelho e o que Alice Encontrou por Lá.
Lewis Carroll era um professor de Matemática, com um gosto especial pela lógica. E isso é bem perceptível em Alice no País das Maravilhas e Através do Espelho. Estes livros são classificados como um nonsense, onde a graça está em tudo aquilo que não tem sentido. Pense neste País das Maravilhas: Lá, a ordem natural das coisas é totalmente diferente da nossa. Tudo o que no nosso mundo – o mundo ‘original’ de Alice – faz sentido e é considerado correto, no País das Maravilhas é tomado como um absurdo. Vice-versa. Lá naquele outro mundo tudo é imposto sem explicações lógicas. E no nosso mundo também.
As Aventuras de Alice no País das Maravilhas e Através do Espelho e o que Alice Encontrou por Lá são duas obras extremamente interessantes, além de serem leituras muito leves e divertidas, cheias de paródias engraçadíssimas, que certamente vão aguçar a imaginação das crianças. Adoro a maneira como Lewis Carroll liga os fatos estranhos daqueles mundos que Alice visitou com os que as crianças vivenciam no seu dia a dia.
[…] “Estive em muitos jardins antes, mas nenhuma flor podia falar.”
“Ponha a mão na terra e sinta”, disse o Lírio-tigre. “Assim vai saber por quê.”
Alice obedeceu. “É muito dura”, observou, “mas não sei o que uma coisa tem a ver com a outra.”
“Na maioria dos jardins”, explicou o Lírio-tigre, “fazem os canteiros fofos demais… por isso as flores estão sempre dormindo.”
Parecia uma excelente razão, e Alice gostou muito de ouvi-la. “Nunca pensei nisso antes!”, disse.
Mas engana-se quem pensa que as obras de Carroll sejam simples contos infantis, pois vale observar algumas coisas que ‘estão nas entrelinhas’ do texto. Alguns trechos e personagens da obra podem ser comparados com a nossa realidade, como o Coelho Branco, que mais parece um burguês que só se preocupa com o tempo e se esquece do mundo a sua volta, ou ainda o Papagaio, que usa seu ‘título’ – “Sou mais velho que você e devo saber mais” – como sinônimo de sabedoria absoluta.
Outra personagem extremamente interessante é a Lagarta. Quando Alice estava caminhando pelo bosque, sem saber para onde ir, sem se lembrar direito de quem era, ela encontra esta lagarta fumando um narguilé em cima de um cogumelo. E a primeira coisa que ela fala ao encontrar a garotinha é: Quem é você?
Entretanto, Alice reclama que havia passado por tantas mudanças nos últimos tempos que já nem se lembrava de quem era. Mas a lagarta se mostra totalmente indiferente a isto, afinal, a mudança é uma ‘regra’ do mundo. Às vezes – desculpe-me, quase sempre – temos a impressão de que o mundo é estável, de que nossa vida é imutável, quando na verdade é totalmente o contrário disto. Por isso, a pequena Alice se mostrava tão desconcertada diante desta pergunta, e a sábia lagarta um tanto indiferente às mudanças.
Apesar de tudo isso, Lewis Carroll introduziu um único personagem que realmente entendia e reconhecia seu papel naquele mundo: o Gato de Cheshire.
“Bichano de Cheshire”, começou, muito tímida, pois não estava nada certa de que esse nome iria agradá-lo; mas ele só abriu um pouco mais o sorriso. “Bom, até agora ele está satisfeito”, pensou e continuou: “Poderia me dizer, por favor, que caminho devo tomar para ir embora daqui?”
“Depende bastante de para onde quer ir”, respondeu o gato.
“Não me importa muito para onde”, disse Alice.
“Então não importa que caminho tome”, disse o Gato.
“Contanto que eu chegue a algum lugar”, Alice acrescentou à guisa de explicação.
“Oh, isso você certamente vai conseguir”, afirmou o Gato, “desde que ande o bastante.”
Como isso lhe pareceu irrefutável, Alice tentou uma outra pergunta. “Que espécie de gente vive por aqui?”
“Naquela direção”, explicou o Gato, acenando com a pata direita, “vive um Chapeleiro; e naquela direção”, acenando com a outra pata, “vive uma Lebre de Março. Visite qual deles quiser: os dois são loucos.”
“Mas não quero me meter com gente louca”, Alice observou.
“Oh! É inevitável”, disse o Gato; somos todos loucos aqui. Eu sou louco. Você é louca.”
Enfim, existem muitos outros trechos do livro que podem passar despercebidos, como se não tivessem sentido algum. É claro que em muitos pontos isto realmente acontece. Mas, em outros, vale fazer um exercício mental para tentar descobrir alguns possíveis sentidos implícitos na literatura de Carroll.
Aventuras de Alice no País das Maravilhas & Através do Espelho e o que Alice Encontrou por Lá, de Lewis Carroll.
Clássicos Zahar – Edição Bolso de Luxo
Com ilustrações originais de John Tenniel
Certamente indico estas duas maravilhosas e surpreendentes obras de Lewis Carroll não só para crianças como também para adultos curiosos.
Por fim, gostaria de propor uma adivinhação: Por que um corvo se parece com uma escrivaninha?