Segundo o poeta Carlos Drummond de Andrade, “entre coisas e palavras – principalmente entre palavras – circulamos”. As palavras, entretanto, não circulam entre nós como folhas soltas no ar. Elas são organizadas em textos, por meio dos quais podem criar significados capazes de transmitir ideias, sentimentos, desejos e emoções.
Muitas delas se combinam de tal forma que fica evidente terem sido selecionadas com a finalidade de compor imagens, sugerir formas, cores, odores, sons, permitindo múltiplas sensações, leituras e interpretações. Isso é o que observamos quando lemos, ouvimos ou vemos um poema, forma de composição que se destaca também por uma espécie de melodia e de ritmo que emanam do modo como as palavras são arranjadas.
O poema é um gênero textual que se constrói não apenas com ideias e sentimentos, mas também por meio do emprego do verso e de seus recursos musicais – a sonoridade e o ritmo das palavras – e de palavras com sentido figurado, conotativo.
A sonoridade que caracteriza os textos poéticos é resultado da utilização de recursos presentes na poesia de todos os tempos, tais como a métrica, o ritmo, a rima, a aliteração e a assonância.
O que é poesia?
Talvez ninguém consiga dar uma resposta definitiva a essa pergunta. Entretanto a poesia está em toda a parte: nas canções de ninar, nas cantigas de roda,nos trava-línguas, nas parlendas, nos provérbios, nas quadrinhas populares, nas propagandas, nas letras de música, nos livros…
O conceito de poesia varia de acordo com a época, o movimento literário e também de escritor para escritor.
Veja a tentativa de responder à pergunta acima no depoimento do escritor mexicano Octavio Paz:
“A poesia é conhecimento, salvação, poder, abandono. Operação capaz de transformar o mundo, a atividade poética é revolucionária por natureza; o exercício espiritual, é um método de libertação interior. A poesia revela este mundo; cria outro. Pão dos eleitos; alimento maldito. Isola; une.”
O verso e a estrofe
Minha desgraça – Álvares de Azevedo
Minha desgraça, não, não é ser poeta,
Nem na terra de amor não ter um eco,
E meu anjo de Deus, o meu planeta
Trata-me como trata-se um boneco…
Não é andar de cotovelos rotos,
Ter duro como pedra o travesseiro…
Eu sei… O mundo é um lodaçal perdido
Cujo sol (quem me dera!) é o dinheiro…
Minha desgraça, ó cândida donzela,
O que faz que o meu peito assim blasfema,
É ter para escrever todo um poema
E não ter um vintém para uma vela.
O poema “Minha desgraça” apresenta doze versos.
Verso é um sucessão de sílabas ou fonemas que formam uma unidade rítmica e melódica, correspondente em geral a uma linha do poema.
Os versos organizam-se em estrofes. No poema em estudo, estão organizados em três estrofes.
Estrofe ou estância é um agrupamento de versos.
O número de versos agrupados em cada estrofe pode variar. Dístico é o nome que se dá à estrofe de dois versos.
Leia o poema a seguir, de Mário Quintana, formado por um único dístico:
Viajante
Eu, sempre que parti, fiquei nas gares
Olhando, triste, para mim…
Vejam como se chamam outros tipos de estrofes:
Terceto: três versos;
Quadra ou quarteto: quatro versos;
Quintilha: cinco versos;
Sexteto ou sextilha: seis versos;
Sétima ou septilha: sete versos;
Oitava: oito versos;
Nona: nove versos;
Décima: dez versos.
Soneto: Uma das composições de forma fixa mais conhecidas é o soneto, em que os versos são agrupados, em duas quadras e dois tercetos. O soneto geralmente desenvolve uma ideia até o penúltimo verso e no último, considerado chave de ouro, apresenta uma síntese do que foi desenvolvido.
Métrica
A métrica é a medida dos versos, isto é, o número de sílabas poéticas apresentadas pelos versos.
Para determinar a medida de um verso, nós o dividimos em sílabas poéticas. Esse procedimento tem o nome de escansão.
Em razão de ter por base a oralidade – fala ou canto -, a divisão silábica poética obedece a princípios diferentes dos que orientam a divisão silábica gramatical: as vogais átonas são agrupadas numa única sílaba, e a contagem das sílabas deve ser feita até a última tônica.
Compare a divisão silábica gramatical à divisão silábica de dois versos do poema em estudo:
Divisão silábica gramatical:
Mi/nha/ des/gra/ça,/ ó /cân/di/da /don/ze/la, (12)
O /que /faz /que/ o /meu /pei/to/ as/sim/ blas/fe/ma (14)
Divisão silábica poética:
Mi/nha/ des/gra/ça, ó /cân/di/da/ don/ze/la, (10)
O /que/ faz /que o /meu /pei/to as/sim/ blas/fe/ma (10)
A divisão silábica poética, conforme você pode observar, a 5ª sílaba do 1º verso e a 4ª sílaba e a 7ª sílabas do 2º verso são formadas pela união das sílabas ça e ó, que e o, to e as, respectivamente. Isso ocorre sempre que há o encontro de duas vogais átonas no final de uma palavra e início de outra. Além disso, na divisão silábica poética, a contagem encerra-se na sílaba tônica da última palavra do verso; nesse caso, na sílaba ze da palavra donzela, no 1º verso, e na sílaba fe da palavra blasfema, no 2º verso.
De acordo com o números de sílabas poéticas, os versos recebem as seguintes denominações: monossílabo (uma sílaba), dissílabo (duas sílabas), trissílabo (três sílabas), redondilha menor ou pentassílabo (cinco sílabas), redondilha maior ou heptassílabo (sete sílabas), octossílabo (oito sílabas), decassílabo ( dez sílabas), alexandrino (doze sílabas), etc.
Ritmo
Ao ouvirmos uma melodia qualquer, percebemos que ela foi composta em determinado ritmo. Um poema também tem seu ritmo, que lhe é dado pela alternância de sílabas acentuadas e não acentuadas, isto é, sílabas que apresentam maior ou menor intensidade quando pronunciadas. O conceito poético de sílaba acentuada nem sempre coincide com o conceito gramatical de sílaba tônica, pois a sílaba poética é determinada pela sequência melódica em que ela se insere.
Observe o ritmo dos seguintes versos de Camões. As sílabas acentuadas estão destacadas.
Amor é fogo que arde sem se ver;
É ferida que dói e não se sente;
É um contentamento descontente;
É dor que desatina sem doer.
Você deve ter notado nesse trecho que o ritmo decorre da incidência de acentuação na 6ª e na 10ª sílaba de cada verso.
Rima
A rima é um recurso musical baseado na semelhança sonora de palavras no final de versos (rima externa) e, às vezes, no interior de versos (rima interna).
Aliteração
É a repetição constante de um mesmo fonema consonantal. Observe como o poeta Castro Alves alitera o fonema /b/ nestes versos:
Auriverde pendão de minha terra
Que a brisa do Brasil beija e balança
Paronomásia
É o emprego de palavras semelhantes na forma e no som, mas de sentidos diferentes, próximas umas das outras. Veja:
“Trocando em miúdos, pode guardar
As sobras de tudo o que chamam de lar
A sombras de tudo que fomos nós.”
– Chico Buarque
Paralelismo
É a repetição de palavras ou estruturas sintáticas maiores (frases, orações, etc.) que se correspondem quanto ao sentido. Observe o paralelismo nestes versos da canção “Sem fantasia”, de Chico Buarque:
“Vem que eu te quero fraco
Vem que eu te quero tolo
Vem que eu te quero todo meu.”